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RAIMUNDO FERREIRA

Coluna do professor e arquivista da Ufac, Raimundo Ferreira: “Papo seringueiro III”

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PAPO SERINGUEIRO III

Partindo da justificativa de que atualmente quem reside na Amazônia, em especial no Acre, nos centros urbanos, dispõem de muito pouca informação e registros históricos sobre a época em que essa região foi ocupada, principalmente pelos nordestinos, que atuaram no desenvolvimento econômico trabalhando nas atividades do extrativismo vegetal, funções estas que contribuiram economicamente para o crescimento da região e consequentemente para a formação das origens da sociedade, exercendo forte influência nas relações sociais da época, e consequentemente contribuindo para formação de uma cultura diferenciada para toda a Amazônia. No entanto, estes hábitos e costumes, que contribuíram para alicerçar as origens da sociedade, especialmente no caso do Acre, estão sendo substituídos pela influência cultural das atividades da agropecuária, que de certo modo, a sociedade, especialmente a juventude, está incorporando como sendo valores de suas origens, ou seja, a sociedade está adotando como modismo essa nova forma de hábitos e costumes da cultura agropecuarista. Assim sendo, sentimos então a necessidade de transcrever um pouco mais da memória histórica, das relações sociais e das atividades desenvolvidas naquela época em que a economia da Amazônia em geral, se destacava como sendo uma produção extrativista da borracha natural e da castanha do Brasil da maior importância para o país. Para que tenhamos uma noção sobre o quanto essa economia foi marcante e o que representou na época da ocupação e da formação dessa geração atual, que de certo modo, parece tentar se esquivar desse passado, podemos por exemplo, destacar que, entre outros centros urbanos da região, destacamos as cidades de Belém e de Manaus, que foram desenvolvidas, inclusive com edificações monumentais, que não existiam em nenhuma outra grande cidade brasileira e que perduram até hoje, e sem contar as atividades artístico-culturais, que na época vinham direto da Europa para realizarem temporadas no Norte do Brasil. No entanto, como em tudo que trás benefício e progresso repentino, geralmente alguém é explorado e sacrificado, a guisa de esclarecimento,
não devemos esquecer, por exemplo, que todo essa força do capitalismo, que enchia os bolsos dos patrões, erguia construções magníficas e fantásticas no meio da selva, desenvolvia cidades do norte até então subdesenvolvidas, importava cultura da Europa e proporcionava a vida luxuosa para toda a família e também para os amigos da nobreza dos coronéis, consumindo do bom e do melhor, como se fosse em um conto de fada no meio da selva Amazônica, tinha uma razão muito maior por trás, pois, conforme os registros históricos, o
dinheiro era ganho com muita facilidade, no entanto, somente esse luxo era possível porque existia um trabalhador,
que era explorado no interior da floresta produzindo a valiosa matéria prima. Para contextualizar historicamente, vamos descrever a razão maior, pela qual os nordestinos foram atraídos para trabalhar na Amazônia. Uma das circunstâncias que fez com que os nordestinos abandonassem sua terra natal, foi o problema da seca que naquela época, por vários anos já vinha castigando o sertão nordestino, causando fome e sofrimento, a segunda causa e motivo oficial, foi o problema da segunda guerra mundial, que tinha iniciados em 1939 e que se prolongou até 1945, e o bloco asiático estava avançando e fechando os caminhos, ou melhor, impossibilitando o bloco aliado aos Estados Unidos de importar a borracha natural da Malásia, que supria as necessidades da indústria pneumática para os veículos e para outras utilidades da guerra. No entanto, o que mais apavorou os americanos foi o episódio em que a marinha e a força aérea japonesa, em 7 de dezembro de 1941, em um ataque preciso e rápido tomou a base militar americana, localizada em Pearl Harbo no Havai. Reconhecendo que os asiáticos estavam se fortalecendo e os americanos correndo o risco de perder a guerra, especialmente porque, entre outras deficiências, não dispunham da borracha natural como matéria prima, o governo americano, Franklin Roosevelt, entrou em contato com o presidente Getúlio vargas, ocasião em que fecharam o famoso ‘Acordos de Washington’, e o Brasil se comprometeu em fornecer essa matéria prima, desde que realizasse um programa convenhado Brasil/Estados Unidos, para atrair a mão de obra nordestina para a Amazônia, daí foi posto em prática programa ‘soldados da borracha’, que alistava os nordestinos e os encaminhavam para a Amazônia, como soldados que iriam contribuir para a causa da guerra, produzindo a borracha, que era fundamental para os americanos. Um primeiro alistamento, em 1943, recrutou somente rapaz solteiro, o segundo, em 1944, já alistou também as famílias. Para incentivar os nordestinos, as propagandas da época anunciavam que a Amazônia seria o Eldorado, ou seja, seria o paraíso, onde se juntava dinheiro com rastelo, na verdade, essa metáfora poderia até ser entendida como verdadeira, no entanto, como sendo o patrão que teria essa possibilidade e felicidade. Bem, por conta desse acordo/convênio entre os dois países, os trabalhadores eram arregimentados no interior do Nordeste, transportados até a capital da Amazônia, para os acampamentos, sendo um dos mais famosos, o de Ponta Pelada em Manaus. Nesses acampamentos nordestinos, que eram apelidados de ‘Brabos’ e ‘Arigós’, ficavam por alguns dias, até aparecer os seringalistas, que após realizarem os contatos, faziam os contratos e levavam esses trabalhadores para os seus seringais. A partir do momento que fechava o negócio, o nordestino, brabo e/ou Arigó, já passaria a ser um seringueiro, e também já começava a acumular dívida. Quando chegavam nos seringais, no meio da selva Amazônica, era necessário adquirir mais uns utensílios e produtos de subsistência, aí já potencializava a dívida de forma astronômica. Não devemos deixar de salientar, que os preços cobrados, desde os transportes, passando pelos os utensílios e produtos que o seringueiro adquiria, os valores eram majorados em no mínimo umas quatro ou cinco vezes acima do preço normal. Aí esses cidadãos eram largados nas colocações dos seringais nativos e a ordem era clara, trabalhar dia e noite na produção da borracha natural, e quando as chuvas começassem a inviabilizar essa atividade, passava-se para a atividade da catação da castanha. Devemos também lembrar, que era proibido cultivar lavoura de subsistência, pois, tudo que o seringueiro precisasse para sobreviver, teria que ser adquirido no barracão, na sede dos seringais, logicamente com os preços calibrados pelo patrão. Esse trabalhador tinha consciência também que, além de ser difícil a possibilidade de fuga, se tentasse certamente iria perder a vida e a desculpa seria de que a onça tinha jantado esse pobre coitado.

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