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RAIMUNDO FERREIRA

Coluna do professor e arquivista Raimundo Ferreira, da Ufac: “Papo seringueiro II”

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PAPO SERINGUEIRO II
Vários leitores que acreditam ser importante o resgate e a divulgação destas temáticas que revivem a época dos seringais nativos na Amazônia e no Acre, nos consultaram sobre a possibilidade de descrever de forma mais detalhada, as atividades e as rotinas de trabalho que estes heróis trabalhadores desenvolviam no meio da selva. Considerando que nossas origens foram alicerçadas nesse ambiente do extrativismo vegetal, vamos tentar rememorar esse tempo em que as relações sociais, a economia e a cultura da Amazônia e do Acre giravam em torno da elaboração da borracha natural e da produção da castanha do Brasil. Esses trabalhadores eram largados nas ‘colocações de seringa’ (moradias dos seringueiros)e obrigados a permanecer no interior da floresta até liquidar suas dúvidas com os patrões, não poderiam e nem deveriam tentar fugir, pois, se assim procedessem, suas vidas estariam correndo riscos fatais de desaparecerem do mapa sendo interrados num buraco de ‘tatu canastra’, onde nem os urubus iriam encontrá-los. Pois bem, depois de “assentados” nas colocações, eram proibidos de cultivar agricultura de subsistência, pois, todas as suas necessidades deveriam ser supridas através do ‘barracão’, sendo encomendadas por intermédio de um funcionário do patrão, o popularmente conhecido por ‘noteiro’, que todo mês visitava o seringueiro, fazia a lista do que ele estaria necessitando, porém, antes de anotar os pedidos, fazia uma vistoria no ‘tapiri’ onde era produzida e armazenada a borracha, a popular ‘defumaceira” ou ‘defumador’ e verificava se havia produto (borracha) pronta em quantidade suficiente, caso não houvesse uma produção razoável de ‘pela’ de borracha, as anotações dos pedidos seriam realizadas, mas, a quantidade de mercadorias solicitadas, seria reduzida ao valor correspondente à produção. Bem, sobre o cotidiano para extração do látex e produção da borracha natural, consistia das seguintes rotinas: cortar cavaco de madeiras apropriadas, – a melhor era o breu -, para queimar na ‘fornalha’, também denominado como ‘buião’, que iria proporcionar a fumaça e pressão para coagular o látex, na formação da ‘pela’ no processo de defumação, e continuava no dia a dia, tendo que despertar muito cedo da madrugada, tomar um café simples, preparar uma farofa de carne de caça, ou somente de ovos, juntar com umas três bananas, abastecer a ‘poronga’ com querosene, que carregava na cabeça para iluminar o caminho, pegar os utensílios para sangrar as seringueiras – ‘cabrita’, balde e ‘saco encalchado’, terçado de bainha e espingarda municiada, e partir pelo ‘espigão’ até chegar na ‘boca da estrada’, onde deixavam a ‘estopa’ (tipo mochila) pendurada no gancho de uma árvore, com a lata de farofa, o balde e o saco encalchado, e partia para a atividade do ‘corte’, (sangria) nas seringueiras. Nessa tarefa, realizava traços na casca das árvores, uma por uma, dependendo do diâmetro, variando de uma a quatro ‘bandeiras’ (demarcação e dimensão dos traços), ’embutiam’ (prender na casca da árvore) no final do traço, onde o látex iria escorrer, a tigela, e nesse ritmo continuava a atividade ‘pela perna direita’, até sair pela ‘perna esquerda’, adentrando nas ‘mangas’ (caminhos sem saída, onde existiam uma ou duas árvores de seringueiras), nos ‘oitos’ (caminhos circulares contendo algumas árvores de seringueiras, que descrevia uma parábola e saia pelo mesmo local da entrada) e nesse ritmo o seringueiro seguia até fechar o ‘corte’, voltando ao ponto de partida, a ‘boca da estrada’. Depois de degustar a farofa com as bananas, tomar água no igarapé das proximidades, partia para percorrer o mesmo percurso, praticamente desfazendo a atividade executado na primeira caminhada, ou seja, ‘desembutindo’ as tigelas e recolher o látex depositado. Terminada essa segunda tarefa, denominada de ‘colha’ (recolhimento do látex), geralmente já no fim da tarde, o seringueiro regressava para casa, acendia o fogo da fornalha, colocava o látex no tacho ao lado da fumaça e começava a banhar a ‘pela’ com o látex e girar na fumaça e calor para coagular e aos poucos ir formando a pela da borracha, esse movimento se repete até não haver mais látex na no tacho. Terminada a tarefa, toma um banho, janta e já prepara os utensílios para iniciar tudo outra vez no dia seguinte. Após umas quatro ou cinco horas de sono, o relógio desperta e é hora de levantar outra vez e partir para a matar e cumprir a mesma rotina. Atualmente uma das temáticas mais discutidas e que sempre está na ordem do dia, trata-se dos direitos dos trabalhadores e das atividades análogas ao trabalho escravo, reconhecemos que esses direitos são legítimos, no entanto, nessa época que estamos descrevendo isso não existia e o único direito que o trabalhador seringueiro tinha, era de ser explorado pelo patrão, trabalhar nas piores condições de trabalho que se possa imaginar, ultrapassar todas estas adversidades e pagar as dívidas que lhes eram impostas, sendo legítimas ou não.

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