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SAÚDE

Em artigo, doutora em saúde pública diz que Brasil continua em segundo no ranking mundial da hanseníase; Acre é referência no tratamento 

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Vamos falar de Hanseníase?

Recentemente, vi um boletim epidemiológico, edição especial de 2024 do Ministério da Saúde, referente aos casos de hanseníase no mundo e no Brasil. Em 2022, foram registrados globalmente 174.087 novos casos de hanseníase. A título de curiosidade, o Brasil permanece em segundo lugar no ranking mundial, e a Índia em primeiro, o que torna esses dois países prioritários para a Organização Mundial da Saúde.
Desde a implantação do tratamento oficial, houve uma redução significativa nos casos da doença, destacando-se a queda de 14% entre 2019 e 2022. Esse dado levanta questionamentos: a redução foi real ou influenciada pela pandemia de COVID-19, que pode ter causado subnotificações, já que muitos doentes podem não ter buscado diagnóstico? A segunda hipótese parece mais provável, considerando o isolamento adotado para evitar o contágio.
Situação semelhante foi observada em nosso país. Em 2022, foram notificados 316.182 casos de hanseníase. No período pré-pandemia, houve uma redução de 0,8%, entretanto, entre 2019 e 2022, a redução foi de 28,4%. O estado do Acre, por exemplo, teve uma redução de 25% dos casos no mesmo período.
Durante anos, o Acre liderou os casos de hanseníase no Brasil, especialmente na região Norte. Esse quadro mudou graças aos esforços do Dr. William John Woods (in memoriam), da Dra. Léia Borges e da equipe do Serviço Estadual de Dermatologia, da qual faço parte desde 2002. Este trabalho, referência mundial, é um exemplo de compromisso, cuidado e tratamento. Não se pode falar de hanseníase sem mencioná-los.
Voltando às minhas dúvidas e hipóteses, fizemos uma breve análise epidemiológica da doença em nosso estado, utilizando alguns indicadores de monitoramento, como novos casos em menores de 15 anos, formas clínicas e grau de incapacidade física, num período de 10 anos.
Observamos que houve redução no número de casos da doença em crianças, de forma mais acentuada durante a pandemia e continuando no período pós-pandemia. No entanto, foi registrado um aumento no diagnóstico da doença em crianças com formas clínicas avançadas e comprometimento de grau 1 e até 2 de incapacidade física, mesmo que a maioria ainda apresente grau zero.
Portanto, destaco que essa redução no número de casos não reflete a realidade, pois temos crianças e adolescentes adoecendo e sendo diagnosticados em estágios avançados da doença. O mais próximo da verdade seria o oposto: casos não diagnosticados nessa faixa etária ou diagnosticados em fases iniciais, sem comprometimento dos nervos.
Esse diagnóstico tardio, observado no período pós-pandemia, pode ser reflexo da hipótese de que as pessoas não procuraram os serviços de saúde durante a pandemia para diagnóstico da hanseníase, buscando atendimento apenas após esse período, o que levou a diagnósticos em estágios mais avançados da doença.
O acometimento da doença em crianças indica a probabilidade de aumento de casos não diagnosticados e falhas nas estratégias de controle. Formas clínicas mais avançadas e lesões nos nervos são indicadores de potencial incapacitante e consequente risco de desenvolvimento de deformidades e incapacidades físicas, o que, além de aumentar o estigma da doença, pode ter impactos negativos em todos os aspectos da vida de menores de 15 anos.
Chamo a atenção para a importância de estratégias de saúde que possibilitem o diagnóstico precoce da doença. Para isso, são necessárias várias intervenções, como a busca ativa de casos, orientação sobre sinais e sintomas da doença, para que a população procure os serviços de saúde. Também é essencial disponibilizar a segunda dose da vacina BCG para os contatos, bem como a avaliação de cada pessoa que conviva com os diagnosticados.
Os serviços de saúde precisam agir de forma mais efetiva, especialmente nas medidas preventivas da atenção básica, com estratégias que visem reduzir o acometimento da doença em crianças e favorecer o diagnóstico em estágios iniciais.
Há inúmeras possibilidades de trabalho que precisam ser incentivadas e pactuadas, como a intersetorialidade na saúde. Quantos eventos ocorrem com grandes aglomerações? Será que nesses eventos há um espaço para orientação sobre hanseníase? Divulgações como: “A hanseníase tem cura. Mancha dormente no corpo? Procure tratamento”, podem ser veiculadas em eventos, propagandas de supermercados, rádios, jornais, televisões, mensagens impressas em contas de água e energia, extratos bancários, anúncios em jogos de futebol, igrejas, delegacias, e serviços empresariais em geral.
É fundamental investir em educação e formação, criando mais espaços nas grades curriculares dos cursos de nível superior, com aulas teóricas e práticas, especialmente para os cursos da área da saúde. Ressalto a importância da promoção de palestras em escolas de ensino fundamental e médio. Lembro-me de uma criança que, aos 7 anos, após assistir a uma palestra, disse à tia que ela tinha hanseníase, e esse diagnóstico foi feito graças ao reconhecimento precoce da doença pela criança.
O compromisso é de todos. Finalizo perguntando: o que você pode fazer para ajudar a controlar essa doença em nosso estado?
Profª Dra. Franciely Gomes  Gonçalves
Pós-doutoranda em Ciências da Saúde/FMABC/Santo André/SP
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