COLUNAS
Em série, o escritor Pitter Lucena lembra personagens da imprensa acreana
O Dinossauro Fé em Deus
Era o ano de 1985, uma época em que a rotina da redação do jornal Folha do Acre era intensa, e foi nesse cenário que minha vida cruzou com a de uma figura ímpar e inesquecível: Fé em Deus, ou melhor, Phewndeys Evangelista de Carvalho. Eu, um repórter em busca de histórias, e ele, o carismático editor-chefe que irradiava energia em tudo que fazia.
Fé era um vulcão prestes a entrar em erupção, com centenas de ideias loucas fervilhando em sua mente inquieta. O jornalismo era sua paixão, e ele o vivia com uma dedicação incomparável, mostrando a todos nós o verdadeiro significado de ética e competência. Como jornalista, era um exemplo a ser seguido, e sua integridade diante dos fatos era inabalável.
Mas Fé em Deus não se restringia apenas ao trabalho. Ele apreciava intensamente as coisas boas da vida e, sobretudo, valorizava as amizades verdadeiras. O amor que nutria por seus filhos era de um carinho e dedicação que deixavam claro que sua alma era maior do que sua própria pessoa.
Sobre Fé, há inúmeras histórias para contar, cada uma delas como um capítulo único de sua vida. Seu sonho de ter um roçado de santa maria no quintal de casa refletia sua ligação profunda com a natureza e a simplicidade da vida.
Contar histórias era uma arte na qual Fé se destacava como um verdadeiro mestre. Era um exímio contador de causos, habilidoso em prender a atenção de todos à sua volta, como se estivéssemos participando de uma viagem pelos mundos mágicos de sua imaginação.
Seu dom para a escrita ia além do jornalismo, alcançando a poesia e a prosa. Fé em Deus era um verdadeiro artista no escrever, e suas palavras encantavam corações, transmitindo emoção e significado em cada frase.
Nossa parceria profissional foi além das páginas do Folha do Acre, estendendo-se para outras oportunidades na TV Globo do Acre, TV Bandeirantes, Jornal Aquiri e jornal O Rio Branco. Trabalhar ao lado de Fé era uma aventura repleta de risos, ideias mirabolantes e histórias cativantes.
Lembro-me de uma ocasião peculiar em que estávamos em frente ao jornal O Rio Branco, quando um carro de Bombeiros passou em alta velocidade com a sirene estridente. Fé, com seu humor peculiar, bateu em meu ombro e soltou uma piada: “Alguém se lascou.” Mal sabíamos que, minutos depois, o telefone do jornal tocaria com uma notícia inusitada: “Fé, a tua casa tá pegando fogo.” Foi um momento memorável em meio a tantos outros na presença desse homem tão cativante.
Fé em Deus era um gênio em tudo que fazia, sempre buscando a beleza e o encantamento no mundo ao seu redor. Apreciava o desenho animado do Pica-Pau e ria de si mesmo, pois sua alegria contagiante era irresistível. Nunca o vi de mau humor, e sua gentileza e atenção para com os demais eram um verdadeiro bálsamo para aqueles que o cercavam.
Hoje, recordo com carinho o dinossauro do jornalismo acreano, que deixou um legado de inspiração e paixão pelo que fazia. Fé em Deus permanece vivo em nossas memórias como um exemplo de como viver a vida com intensidade, amor e amizade verdadeira. Sua presença continua a ser sentida e sua ausência deixa saudades, mas o impacto de sua energia inesgotável e seu espírito aventureiro permanecerão como um farol para aqueles que seguem o caminho do jornalismo com o coração.
Pitter Lucena – Jornalista e escritor