RAIMUNDO FERREIRA
‘Inflingindo as regras’ é o título da coluna do professor Raimundo Ferreira, sob o qual fala sobre o que era o futebolista antes e o que é na atualidade
INFLIGINDO AS REGRAS
Ainda conheci uma época em que a prática do futebol, embora já fosse considerada uma modalidade esportiva, não era vista, segundo a avaliação popular da época, como uma atividade ou ofício digno de dedicação. Os jovens que se entregavam a esse jogo não eram respeitados como pessoas que administravam a vida com a seriedade que os padrões vigentes consideravam apropriada. Em síntese, o futebol era tido como coisa de desocupado — ou, como se dizia, de “vagabundo”.
Esse tempo passou. As preferências e os valores mudaram, especialmente no que diz respeito à rentabilidade. O que antes era apenas um jogo de rua ou de várzea tornou-se uma indústria milionária. Hoje, essa atividade esportiva pode render fortunas tanto aos praticantes quanto aos empresários do ramo, transformando-se em um dos negócios mais lucrativos do mundo. Os jogadores se tornaram verdadeiros popstars, e os dirigentes esportivos, empresários e investidores figuram entre os mais bem-sucedidos da atualidade.
No entanto, como ocorre na maioria dos negócios de grande rentabilidade, os lobbies, os interesses escusos e a ganância de lucrar sempre mais acabam por desvirtuar — e muitas vezes até corromper — as regras do jogo. A partir daí, como se diz no popular, “os negócios e a bola passam a rolar juntos”, e a atividade esportiva começa a servir a propósitos alheios ao espírito esportivo. Passam a surgir conchaves, favorecimentos e alianças espúrias entre dirigentes, empresários e até instituições que deveriam zelar pela lisura das competições.
Hoje, os amantes do futebol, torcedores e até entidades envolvidas nesse universo têm assistido a espetáculos lamentáveis. A atuação de alguns mediadores — os árbitros — vem sendo questionada, e há indícios de conivência de certos dirigentes esportivos. Tudo isso tem contribuído para distanciar o futebol de sua essência, deixando no ar uma dúvida incômoda: o que se vê em campo ainda é esporte — ou apenas mais um negócio manipulado por interesses e ambições desmedidas?