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CULTURA & ENTRETENIMENTO

Livro do jornalista Pitter Lucena, “O vôo da morte” reconta a história a partir de depoimentos de envolvidos no acidente com avião da Rico

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Há tragédias que se recusam a ficar no passado. Elas permanecem latentes, nos corredores da memória, como ecos de uma noite interminável. O acidente aéreo que vitimou o voo da Rico em 2002 é uma dessas tragédias. Uma ferida aberta no céu amazônico, uma cicatriz indelével na alma de quem viveu aquela noite. Mais do que uma simples queda de avião, foi uma colisão brutal entre a esperança e o desespero, entre a vida e a morte, que deixou marcas profundas em todos nós que testemunhamos seus desdobramentos.
Este livro, “O Voo da Morte”, é uma tentativa de resgatar essa história do limbo do esquecimento, de contar o que realmente aconteceu naquela fatídica sexta-feira, 30 de agosto de 2002. A ideia de escrever sobre o assunto nasceu da urgência de dar voz às emoções silenciadas pela dor e pela burocracia, de revisitar os sentimentos que, por tanto tempo, ficaram guardados nos bastidores da memória. Foram anos de convivência com lembranças fragmentadas, como um mosaico feito de pedaços de uma noite de horror que nunca acabou.
Ao iniciar esta jornada de escrita, me vi diante de um dilema: como narrar um evento tão doloroso sem cair na banalização? Como dar ao leitor uma experiência próxima da realidade sem transformar o sofrimento em espetáculo? A resposta, acredito, está na honestidade com que relato os fatos, na transparência em revelar o que vi, ouvi e senti.
Naquela noite chuvosa, eu era um repórter do jornal A Gazeta de Rio Branco, em um plantão que parecia comum, até que um telefonema de um jornalista da Folha de São Paulo mudou tudo. “Um avião caiu em Rio Branco”, ele disse. A frase ecoou como um trovão em minha mente. Corri para o Pronto Socorro, onde os corpos das vítimas começaram a chegar, empilhados em caminhonetes enlameadas, misturados ao sangue e à água da chuva. Famílias se aglomeravam em busca de notícias, os gritos de dor e desespero ecoavam como um lamento contínuo. A cada novo corpo que chegava, a esperança se esvaía um pouco mais.
Eu estava lá, testemunhando aquela cena dantesca, entre a lama e o sangue, ao lado de amigos jornalistas que, como eu, sentiam o peso daquela cobertura. Ezi Melo chegou para me ajudar na apuração. Amarildo Rodrigues, meu colega, se deslocou para o aeroporto, onde as informações eram ainda mais confusas e desencontradas. Vivíamos um caos de informações truncadas e telefonemas incessantes, tentando entender a magnitude do desastre.


Vamos revisitar, juntos, os detalhes da investigação, os esforços de resgate, o luto de uma cidade inteira e, principalmente, as histórias de vida interrompidas abruptamente naquela noite escura.
Não foi fácil revisitar este passado. Ao escrever, voltei a sentir o cheiro amargo do sangue misturado com a água da chuva, o toque gelado dos corpos inertes, o som dos gritos de dor que ecoavam pelo pronto-socorro e pelo Instituto Médico Legal. Senti novamente a impotência diante da tragédia, a urgência em tentar entender o que não pode ser compreendido plenamente.
A ideia de “O Voo da Morte” é, sobretudo, lembrar. Lembrar daqueles que partiram, daqueles que sobreviveram, daqueles que trabalharam incansavelmente para salvar vidas e trazer algum conforto aos que ficaram. É uma tentativa de dar um sentido, ainda que mínimo, àquilo que parece inexplicável. É contar uma história que precisa ser ouvida, para que o impacto dessa noite seja reconhecido e jamais esquecido.
O livro não traz respostas definitivas — talvez, elas nunca existam. Mas traz uma visão honesta, pessoal e direta de quem viveu aquele pesadelo de perto. Ao mergulhar nas páginas desta obra, peço que o façam com o coração

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