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O Xapuriense que instalou a sua ‘casa’ num ponto de táxi no Parque do Tucumã e que desacreditou da vida

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Por Wanglézio Braga / Foto: Wanglézio Braga

É na sombra de um pé de apuí fincado no Parque do Tucumã, em Rio Branco, que o natural de Xapuri, Pedro Barros, de 62 anos, deixa literalmente a vida passar: Sem estresse, porém, zero expectativa de mudança real. Sem casa, nem condições de pagar um aluguel, o catador de reciclados frisa que verá um mundo melhor tanto para ele quanto para os outros moradores de rua espalhados por um dos principais cartões postais da capital acreana.

A história do Seu Pedro Barros é muito parecida com a de muitos que, sem condições financeiras ou por falta de apoio da família, preferem habitar lugares inacreditáveis a viver ao relento. Há pelo menos quatro meses, Barros vive num ponto de táxi que temporariamente está inutilizado pelos profissionais. Por causa da pandemia do novo coronavírus, a companhia de táxi preferiu sair do local, devido ao baixo movimento de clientes. É neste ambiente que ele chama de “lar, meu lar”. O endereço é BR-364, km 04, Distrito Industrial, mais precisamente no portal principal de entrada da Universidade Federal do Acre (UFAC).

O vai e vem dos veículos, o barulho do trânsito já não é problema para ele, o principal incômodo, segundo nos relatou, é a chegada do período chuvoso. Por ser viver numa estrutura de ponto de táxi, o local não é vedado, não possui paredes e muito menos dignidade para um ser humano. “Carros, ônibus, motos, são tudo meus vizinhos! Não posso pedir para eles fazerem silêncio, né? O jeito é suportar (…) Mais tem coisa que não suporto, dormir no molhado é ruim!”, comentou.

Após alguns minutos de conversa com a equipe do AcreNews, Seu Pedro nos convidou a ‘entrar na sua casa’. No lugar, logo se vê certa organização e limpeza. A regra é clara: Nada de amontoados! Tudo que ele acha na rua, fica no carrinho estacionado ao lado da árvore. De pronto, há espaço para alguns bens que restaram do barraco: Um colchão, algumas panelas, caixas de roupas, mesa, geleira, rede de dormir e um pequeno fogão onde prepara os alimentos. Comida que é comprada com horas de trabalho pelas ruas catando latas. Cada quilo que consegue, de alumínio, os compradores pagam R$ 3 reais.

“É pouco, muito pouco, eu sei. É o que a gente pode. Tem alguns dias que consigo muito mais que um quilo, só que outros que consigo poucas gramas. Não rende um quilo”, frisou.

Para cozinhar os alimentos, para beber água, limpar a ‘casa, Seu Barros recorre às instalações da UFAC. Uma torneira instalada na guarita da instituição, vem servindo como suporte para ele. É desta mesma água que ele utiliza para tomar banho e fazer a higiene. “Essa água serve pra tudo, meu irmão. Eu não posso usar papel higiênico, daí penduro essas garrafas com água para esse fim, me lavar. Eu faço as minhas necessidades lá na frente porque aqui não tem banheiro, uso um lugar escuro, escondido para fazer isso. Não é fácil”, contou.  

Barros vivia em Xapuri antes de se mudar para Rio Branco, aliás, a chegada à capital não foi como ele aguardava, planejava. A falta de humanização no atendimento aos moradores de rua foi a principal revolta, justificativa, que ele apresentou para não esperar pela caridade alheia da população, das ONGs e dos governos.

“Eu vim de Xapuri porque morava numa invasão. Lá eu fiz o meu barraco. Um barraco simples, sem muita coisa. Mais era o meu lar, moço! A justiça mandou que todos nós, invasores, saíssemos de lá. O dono é muito rico e não queria a gente nas terras. Eu perdi tudo que conquistei em apenas alguns minutos depois da chegada da polícia”, relatou e continuou “Quando cheguei a Rio Branco, de carona, eu pensei que fosse melhor. Ia arrumar um emprego, ia ter pessoas melhores para ajudar, mas nada disso aconteceu. Eu passei a viver em muitos lugares nesse parque, lá pelo centro também. Aqui é o melhor lugar, ninguém perturba”.

Pedro não tem filhos. Seus familiares perderam o contato com ele ainda em Xapuri após a separação com a ex-companheira e a demolição do casebre. Do paradeiro dela, ele não sabe. Na realidade, falar em família é algo que visivelmente incomoda o homem. “Eu não tenho família. Não posso esperar por ninguém do meu sangue”, salientou.

Questionamos sobre o apoio do poder público, via assistência social tanto do estado quanto do município. Pedro disse que procurou ajuda, foi cadastrado para dormir em um abrigo localizado no Segundo Distrito, porém, a falta de empatia e humanização, como havia reclamado posteriormente, o induziu a sair do ambiente coletivo. “Eu saí de lá porque judiaram de mim. Serviram comida estragada, contaminada. O pessoal não atendia a gente bem (…) não quero voltar nunca mais para esse lugar”, revela.

Insistimos sobre programas sociais de aluguel ou da casa própria. “Isso é um sonho pra mim. Não me ajudaram, e nem vão fazer. Moço, eu poderia viver lá no meu barraco sossegado, sem depender de ninguém, apenas com o meu trabalho. Mas a idade tá chegando, muita coisa eu não faço. E confesso pra ti que perdi as esperanças”, disse.

Por fim, Seu Pedro manifestou contentamento com ajuda de pessoas que de bom coração, de bom grado, possam oferecer alimentos para ele. “Eu aceito sacolões, dinheiro para ajudar na compra do mês. Eu não tenho telefone, mas sempre tô aqui. Caso alguém queira me ajudar, eu ficarei feliz”, concluiu.

DADOS

Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em pesquisa publicada em março de 2020, as estimativas do número total de pessoas em situação de rua no Brasil é de aproximadamente 221.869. 

O único levantamento do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para essa população, realizado em 2008, apontou cerca de 50 mil pessoas. Já o Serviço Único de Saúde (SUS) registrou 155 mil atendimentos no programa Consultório da Rua (voltado para a população de rua), em dezembro de 2020, número que representa três vezes mais que o registrado em 2019.

O DEBATE POLÍTICO

Por conta do aumento no número de pessoas que vivem em situação de rua, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal (CDH) promoveu uma audiência pública, no mês passado, com foco na situação dessas pessoas. Os debatedores, que participaram da audiência de forma remota, apontaram que essa população cresceu no país com a pandemia do coronavírus. Eles também cobraram mais atenção do poder público com esses brasileiros. De atitude, apenas alguns projetos que seguem sem tramitação e que possibilitaria vida melhor para esses cidadãos.

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