ESPORTE
Onde anda o comentarista Nonato “Pepino”, que perdeu a visão mas continua enxergando bem o futebol e a política
Por Evandro Cordeiro | Fotos: Cedidas/Arquivo
O técnico agrícola Raimundo Nonato de Oliveira deu certo como técnico agrícola. Formado em Presidente Prudente, nos anos 1960, ele voltou para o Acre e prestou muitos serviços durante os governos Wanderley Dantas, Geraldo Mesquita, Joaquim Macedo e Nabor Júnior. Ajudou no progresso da lavoura em um estado que estava saindo do extrativismo, mas a fama e o maior sucesso da vida ele fez mesmo como jornalista e comentarista de futebol. Foi aí que ele ganhou o apelido famoso, Nonato “Pepino”. O “Pepino”, segundo ele mesmo, vem dos cuidados que tinha as plantações como técnico que era.
Contestador de nascença, foi, como repórter, crítico contundente, sobretudo na época áurea do jornal O Rio Branco, jornal do qual era editor do setor de comunidades. No rádio, no entanto, deixou sua principal marca. Foi um comentarista coerente e, acredite, moderno para época. Já enxergava o que poderia vir de ruim para o esporte no futuro, assim como as coisas positivas. “Profissionalizar o futebol no Acre não vai ser uma boa coisa, ao menos por enquanto”, dizia. Acabou com alguma razão. Os estádios esvaziaram, depois do advento do profissionalismo, para citar apenas uma das muitas incongruências da nova era previstas por ele, um mago das conjecturas.
Raimundo Nonato de Oliveira “Pepino” tem hoje 76 anos e mora em uma casa frugal no conjunto Castelo Branco com a esposa Gladys, há pelo menos 35 anos. Infelizmente, o Glaucoma apagou a visão do exímio comentarista. Há 15 anos ele perdeu a visão 100%. Mesmo assim não perdeu a picardia de bom jornalista, nem a capacidade de enxergar as coisas a distâncias maiores que gente com visão limpa. Continua um crítico azedo do sistema político e do futebol. Depois da cegueira, Nonato ainda voltou para o rádio, onde comentava de casa com base naquilo que o narrador ia discorrendo, mas a queda de produção do esporte no Acre, com participações pífias do nosso futebol e competições nacionais, entristeceu aquele que já foi considerado o melhor comentarista do rádio no Norte e ele recuou. “Fica em casa o dia todo ouvindo rádio. É um programa de esporte atrás do outro. E ouve da Difusora as rádios nacionais”, diz a esposa, dona Gladys, com quem teve dois filhos, Ricardo e Rafael Oliveira, em quem Nonato apostava como jogadores. O primeiro ainda chegou a jogar no futebol profissional, mas largou a carreira cedo para se dedicar ao trabalho. Rafael seguiu outra carreira.
Além da Emater, onde prestou serviços como “capa gato”, como eram chamados os técnicos agrícolas, Nonato “Pepino” trabalhou no jornal O Río Branco e foi comentarista esportivo nas rádios Difusora, Andirá, Voz dos Nauas, em Cruzeiro do Sul, e 06 de Agosto, em Xapuri. A estreia foi em 1967. “Adorei aquilo, porque no outro dia os torcedores vinham me cumprimentar e concordar ou discordar dos meus comentários”, me disse certa vez o lendário “Pepino”..
Nonato não sabe se ainda voltará a falar no microfone de uma rádio, mas tem certeza que enquanto vida tiver não deixará de ouvir sua paixão da vida toda, o rádio. A esposa confirma: “Gasto uma fortuna comprando rádio novo pra ele”. Tudo isso no maior bom humor. Ela diz que os problemas que aparecem, como a cegueira do marido, não podem suplantar as coisas boas da vida. Para se ter uma ideia, Gladys conta que, apesar de cego, “Pepino” não deixou de fazer deveres de casa. Ele limpa o quintal e até conserta móveis, quando é necessário. “Ele acerta o dedo com o martelo, de vez em quando, eu me abro, e ele leva na brincadeira”, confessa. Ultimamente, segundo ela, o consagrado jornalista adquiriu um hábito novo: tem trocado o dia pela noite. “Ele acorda às 4 da tarde, come, e vai pro rádio, quando não tem o que fazer dentro de casa. Aí só vai dormir de madrugada, tu acredita, Evandro?”, relatou ao Acrenews, as gargalhadas, bem seu estilo.
Nonato tem suas limitações naturais devido a ausência da visão, mas essa parte é abafada com o carinho da família. Ele é paparicado pela esposa, os dois filhos e os netos e, conta a esposa, não tem ressentimentos pela cegueira. “Nunca vi ele se maldizer por isso”, garante. Nonato tem só uma reclamação a fazer, a falta que sente de muitos amigos que desapareceram de seu convívio a medida que a luz do dia foi desaparecendo de seu globo ocular, normal das relações humanas.
Da nossa parte, vida linda ao “Pepino”!
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