Prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom concede uma das entrevistas mais lúcidas; fala dos desafios do mandato e da reeleição

FRASES DO PREFEITO

“Rio Branco é a cidade mais iluminada da Região Norte e queremos transformá-la na mais bonita”.

“Administrar uma cidade que não foi planejada é um desafio”.

Por Jorge Natal

Ruas esburacadas; enlameadas num período do ano e empoeiradas noutro; ausência de calçadas e pouquíssimas ciclovias; trânsito caótico; poluição sonora e visual; violência que já se estendeu ao campo; altos índices de consumo e tráfico de drogas; enchentes; desemprego. Bem-vindo a Rio Branco, uma cidade que não foi planejada, complexa e há décadas negligenciada.

Nascida às margens do rio Acre, está centenária localidade anualmente é alagada. O fenômeno causa prejuízos e transtornos para milhares de pessoas, que não possuem moradia digna. E se no Nordeste existe a “indústria da seca”, temos uma versão às avessas por aqui. Moradias? Além de não serem prioridade nas políticas públicas, quando acontece é de forma inadequada (vide Cidade do Povo).

Quando o assunto é saneamento básico, somos uma África. Segundo o Instituto Trata Brasil, estamos entre as capitais que mais despejam seus dejetos nos cursos d’água, sem tratamento prévio, obviamente. Menos de 3% do nosso esgoto é tratado. O marco regulatório, política nacional para pôr fim a essa mazela, ainda não chegou por aqui.

Os nossos vizinhos fronteiriços, o Peru e a Bolívia, os maiores produtores de cocaína do planeta, encontram aqui tudo o que precisam: jovens para consumir e traficar seus produtos. Não é por acaso que temos a maior e mais jovem população carcerária do país, proporcionalmente falando. A disputa por esse “mercado de trabalho” está estampada nas manchetes dos veículos noticiosos: diariamente, duas pessoas morrem de forma violenta em Rio Branco.

Para falar desses e de outros infortúnios e também para avaliar a sua gestão, conversamos com o prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom, de 70 anos. Oriundo do estado do Paraná, já foi prefeito por três vezes no município de Acrelândia. Há dois anos e meio à frente do cargo, o alcaide disse que a cidade estava destruída, que está organizando-a e fazendo maciços investimentos.

Ele assegurou que tem mais R$ 400 milhões para serem investidos, quantia da qual se orgulha de ter economizado. Comprometeu-se com a construção de dois novos viadutos, além do já conhecido na AABB, um logo mais à frente, na rotatória do Araújo Mix, e um segundo, em frente ao Horto Florestal.

Bocalom é turrão e de personalidade autoritária, o que pode explicar a rejeição que sempre o acompanha. Se é bom gestor, isso deixamos com o leitor. Candidato à reeleição, ele recebeu a nossa reportagem em seu gabinete e nos concedeu esta entrevista. Ei-la:

Acre News – Como estava a cidade quando o senhor assumiu a prefeitura?

Bocalom – Administrar uma cidade que não foi planejada é um desafio. São muitos os problemas com infraestrutura, saúde, transporte coletivo, entre outros. Parecia uma tábua de pirulitos. A Emurb ficou dois anos sem trabalhar. Eu estou feliz e por que? Porque, para começar, o nosso trabalho chegou a locais onde nunca ou há muito tempo não chegava. São inúmeros os exemplos e depoimentos. Talvez demore um pouco, mas é um trabalho bem feito. Até o ano passado, fizemos 1.300 ruas. Após a tragédia da enchente, desencadeamos a operação “Recupera Rio Branco” e já mexemos em 440 ruas. Depois, começaremos outro, o “Asfalta Rio Branco”. Esses dois programas, que totalizam R$ 80 milhões, são com recursos próprios. Também vamos realizar alguns convênios com o governo federal. Rio Branco nunca esteve tão limpa e organizada como está hoje. É a cidade mais iluminada da Região Norte e queremos transformá-la na mais bonita.

Acre News – E as vias do programa “Ruas do Povo”?

Bocalom – Isso é um gargalo porque são mais de 600 ruas judicializadas. Em 95 destas, a prefeitura já mexeu porque são aquelas vias imprescindíveis onde passam os ônibus ou têm escolas. O problema das ruas do povo não é só o pavimento. É a drenagem pluvial e o esgoto, que está voltando para a casa das pessoas. Foram gastos R$ 450 milhões com um serviço de péssima qualidade. Quem fez essa porcaria não foi a prefeitura nem o atual governo. Foi o governo passado. Essa patifaria rendeu inúmeros problemas e o dinheiro sumiu. Enquanto isso, os bancos que cederam os empréstimos, querem receber. Em breve, iremos firmar uma parceria com o governo estadual para recuperar essas ruas.

Acre News – O que mais lhe tem causado orgulho neste momento da gestão?

Bocalom – Um deles é ter uma equipe competente, comprometida e honesta. O outro é ter continuado e até ampliado os serviços, mas com um caixa de mais de R$ 400 milhões. Outro é que chamamos para nós as nossas responsabilidades. Todo mundo sabe que quem cuidava dos parques era o governo. E da mesma forma com as ruas principais da cidade, ou seja, a prefeitura, daqueles tempos, parecia que não era um ente autônomo. Estava mais para um puxadinho do governo.

Acre News – Mudando de assunto, qual é a situação dos ramais?

Bocalom – A prefeitura nunca se preocupou em fazer ramais. Só existia uma patrol na Emurb. Como iríamos fazer ramais sem equipamentos? Estamos comprando um maquinário novo. Cerca de 55 máquinas já estão trabalhando neste verão. No ano passado, fizemos mais de 200 km de piçarramento, que rodou de inverno a verão. Vamos mexer em 1.200 km ramais e, se Deus quiser, vamos piçarrar uns 500 km. Sem contar outros serviços como pontes e bueiros. Recentemente houve uma manifestação no Barro Alto, mas não passa de politicagem. As máquinas estão naquela região, ou seja, existe uma programação e as intervenções irão chegar lá.

Acre News – Com esses ramais prontos, Rio Branco vai ter produção agrícola?

Bocalom – Através da agricultura familiar, estamos incentivando o plantio do arroz, do feijão e do milho. Iremos gradear a terra e fazer a calagem. Tanto a hora de trator como o preço da calcário, serão, em partes, custeados pela prefeitura. E os agricultores só irão pagar com a venda da produção. Além disso, tem a análise de solo e a adubação. Estamos doando as casas de vegetação para os produtores de hortaliças. Também providenciamos 150 novas barraquinhas para os feirantes. Acabamos com o frete e o aluguel das barraquinhas. Em 2020, o orçamento da Agricultura era de R$ 600 mil reais. Nós o levamos para R$ 58 milhões neste ano.

Acre News – E a Saúde?

Bocalom – Estava um caos. Um médico tinha a sua carteira assinada com um salário de menos de R$ 2 mil. Como um profissional desses iria ter estímulos para trabalhar? Nós colocamos R$ 9 mil na carteira e mais 4 de ajuda de custo. Estamos contratando 58 médicos, cerca de 30 enfermeiros e, num convênio com o programa Mais Médicos, chegará mais 32 desses profissionais. Iremos ter uma saúde de qualidade. Também iremos botar para funcionar oito vans odontológicas, através de uma emenda parlamentar do senador Márcio Bittar. Ah, também zeramos a fila de pequenas cirurgias e estamos fazendo isso também na zona rural. Estamos ainda construindo dez unidades de saúde de porte 1, 2 e 3 e mais um Caps, que é o atendimento psicossocial.

Acre News – Rio Banco padece por causa da ausência de saneamento básico. O que o senhor vai fazer frente a isso?

Bocalom – Não iremos privatizar. Quem vai tratar o esgoto e levar água às casas das pessoas será o poder público, no caso a prefeitura. Araguari e Uberlândia, em Minas Gerais, tocam esses serviços e funcionam muito bem. Quanto se privatiza, o preço da tarifa aumenta até seis vezes. Caso isso acontecesse, o nosso consumidor, que paga R$ 17 reais, iria pagar 100. A minha preocupação é com as pessoas mais humildes. Quanto ao esgoto, que só é tratado 2,5%, vamos elevar esse número para mais de 40%, através de uma parceria com o governo estadual.

Acre News – E o caótico e falido transporte coletivo?

Bocalom – Como pode ser caótico se não tem mais reclamação? Antes, toda vez que subia o combustível, aumentava o preço da passagem. Agora, o combustível dobra de preço e a gente baixa a passagem. Antes quem financiava as gratuidades era o trabalhador assalariado. Acabamos com isso. Só esse ano, estamos gastando R$ 25 milhões com o transporte coletivo. Estamos abrindo licitação para comprar dez ônibus elétricos. Estamos também abrindo uma nova licitação para que, a empresa que vencer, ganhe por quilômetro rodado, como acontece em várias cidades do país.

Acre News – O senhor é candidato à reeleição?

Bocalom – Claro que sim. O que me colocou aqui em Rio Branco foi o trabalho de excelência que eu fiz em Acrelândia. É o meu trabalho de agora que vai me dar a reeleição ou não. Mas tenho certeza que vamos ganhar bem.