POLÍTICA
Valterlúcio Bessa Campelo escreve no pós- eleição: Em Rio Branco, o clássico estúpido de Bonhoeffer
Valterlucio Bessa Campelo
Embora frequente pouco as cátedras universitárias atuais, Dietrich Bonhoeffer foi um pastor luterano alemão, teólogo, filósofo de grande importância na resistência ao nazismo. Ele nasceu em 1906 e foi executado em 1945, poucos dias antes do fim da Segunda Guerra Mundial. Bonhoeffer desenvolveu em pouco tempo uma magnífica obra sobre a fé e a ética cristã. Em poucas palavras, suas ideias defendem a fé como discipulado, ou seja, que o cristão deve viver sob o signo da bondade e compromisso com a humanidade, que a igreja deve ser vivida em comunidade, quer dizer, preocupada com a justiça e as lutas sociais e que para ser cristão há que se dispor a enfrentar preconceito, perseguição e sofrimento.
Mas o legado de Bonhoeffer não é apenas teológico. Em cartas e sermões que escreveu, basicamente nos anos 1930 e 1940, ele deixou, não sistematizadas em termos acadêmicos, ideias que passaram a ser conhecidas pelos estudiosos como uma “teoria da estupidez”. Dietrich Bonhoeffer não publicou um livro, capítulo ou artigo intitulado “Teoria da Estupidez”, o termo é uma construção posterior, baseada em suas reflexões sobre a condição humana e os desafios de sua época, especialmente durante o regime nazista.
O que é para Bonhoeffer, a estupidez? Diz ele: “parece que a estupidez não é propriamente um defeito congênito, mas um processo em que as pessoas se tornam estúpidas sob certas circunstâncias, ou deixam-se fazer estúpidas de forma recíproca. Também observamos que a estupidez aparece mais em pessoas ou grupos propensos ou condenados a viver em comum do que em pessoas mais fechadas, reservadas e solitárias. Assim, parece que a estupidez é um problema mais sociológico do que psicológico”.
Lembrei de Bonhoeffer quando comecei a ver as desculpas para a derrota acachapante do Marcus Alexandre. Se, antes, a disputa ia ser no buraco da rua e, por isso, Marcus era favoritíssimo dado seu conhecimento profissional, seus planos perfeitos, sua comunicação fácil etc., depois do resultado medíocre nas urnas quando recebeu os velhos 1/3 do eleitorado esquerdista, o buraco da rua foi esquecido e a desculpa passou a ser o uso da máquina pública. É como dizer que a eleição foi ILEGAL, pois o uso dos recursos públicos em favor de determinada candidatura é expressamente proibido em LEI.
Os termos da Lei 9504 são claros. Os serviços, as instalações e os funcionários de qualquer repartição federal, estadual ou municipal, autarquia, fundação do Estado, sociedade de economia mista, entidade mantida ou subvencionada pelo poder público ou que realiza contrato com este, inclusive o respectivo prédio e suas dependências, não poderão ser utilizados para beneficiar partido ou organização de caráter político, sob pena de prática de crime. Pena: detenção de 15 dias a 6 meses e pagamento de 30 a 60 dias-multa. Incorrerão na pena, além da autoridade responsável, os servidores que prestarem serviços e os candidatos, membros ou diretores de partido que derem causa à infração.
Essa versão fajuta de que a lavada se deu pelo uso da máquina em favor do Bocalom deveria ser denunciada com provas ao TRE que, certamente, não iria se omitir. Se não pode ser sustentada nos fatos, não passa de choro do surubim ou, como se dizia na minha infância, desculpa de amarelo que comeu barro.
Ao mirar o estúpido, Bonhoeffer tinha em vista exatamente esse sujeito alienado, que não percebe o que está diante de suas fuças porque seus neurônios foram dopados por um ódio coletivo a determinado ente, seja ideológico ou simbólico. O sujeito estupidificado precisa se sentir confortável entre aqueles com quem convive, então não se importa de cegar e seguir o bonde da estupidez.
Marcus Alexandre perdeu basicamente porque não conseguiu, ainda que tenha tentado por muitos meios, se libertar do passado de esquerda. Para isso, ele precisaria romper com esses setores e não apenas fazer um malabarismo retórico “sou de centro”. Toda vez que o alvo, ou seja, o eleitor mais à direita, olhava para o Marcus via as sombras do PT, de Jorge e Lula na sua retaguarda. Resultado obvio, ele não convenceu. Por outro lado, não podia defenestrar os aliados e amigos de longa data. O máximo permitido foi escondê-los na propaganda, o que só serviu para “matar de vergonha” o Jorge e companhia.
Do seu bunker, Bocalom deitou e rolou abraçado com a direita. Fez discursos, usou vídeos, sedimentou a imagem bolsonarista e foi pro abraço segurando o eleitor que Marcus buscava. A esquerda desertou do combate, se agarrou na esperança de retorno depois da vitória de seu pupilo. Se fossem lógicos, talvez os PTEMEDEBISTAS chorosos na TV entendessem que o embate ideológico não se traduz num pedido de votos do Bolsonaro na base do dedaço, então, não é dizer que um pedido seu determine a vitória, ele apenas, mas decisivamente, garante o registro do candidato no time destro, daí em diante outros fatores se somam na formação da escolha do eleitor. Pergunto: É difícil entender isso?
Infelizmente, o estúpido praticamente não tem cura porque já disposto à servidão (nos termos de Etienne de La Boétie), ele se agarra como um carrapato ao último fio de confiança nas teses que defende. É mais fácil convencer alguém de um erro do que de que ele está errado. Renunciar ao grupo de pertencimento, mesmo que alienado, seria fatal para ele. Então, mesmo diante da lógica ele seguirá adiante, agarrado a um molambo partidário sem compreender a operação 2+2.
Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS e, eventualmente, no seu BLOG, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no DIÁRIO DO ACRE, no ACRENEWS e em outros sites. Quem desejar adquirir seu livro de contos mais recente “Pronto, Contei!”, pode fazê-lo através do e-mail valbcampelo@gmail.com.