RAIMUNDO FERREIRA
Nosso articulista Raimundo Ferreira relembra a saga dos Arigós no Acre, influindo sua família, os Ferreira de Mossoró
OS FERREIRAS DE MOSSORÓ
Raimundo Ferreira
Conforme somos sabedores as condições de sobrevivência no interior do nordeste brasileiro, mesmo com os atuais avanços tecnológicos e as melhorias estruturais, ainda apresentam dificuldades. Imaginemos a situação enfrentada pelos povos sertanejos na última metade do século passado, até porque, além de não existirem estas facilidades da atualidade, o fenômeno das secas prolongadas castigava toda a região nordestina. Sem dúvida, essa situação transformava esse território em um dos lugares mais inóspitos para sobrevivência humana. Foi por essa época que as pessoas, especialmente as menos favorecidas, juntavam-se em grupos famintos, abandonavam suas localidades e saiam perambulando sem destino em busca de melhorias de vida, fenômeno este, que foi denominado de retirantes, inclusive tendo sido bastante explorado pela literatura regional nordestina, especialmente, no romance “vidas seca”, de Graciliano Ramos e também ilustrado com muito realismo na obra do artista plástico, Cândido Portinari, Os Retirantes.
Foi nesse contexto de total desalento e necessidades extremas, que começaram a surgir os boatos de que havia a possibilidade de os nordestinos migrarem para a Amazônia para trabalhar nos seringais nativos, na atividade do extrativismo vegetal, para produzir borracha natural, que iria dar suporte à indústria bélica e pneumática na segunda Guerra mundial. O boato foi crescendo e tornando-se o assunto do momento por todos os recantos do nordeste. Para potencializar e oficializar a notícia, os nordestinos tomaram conhecimento que essa ação fazia parte dos Acordos de Washington, que haviam sido firmados entre o governo brasileiro de Getúlio Vargas e governo americano, Franklin Roosevelt, em 14 de setembro se 1943. Não demorou muito para as propagandas começarem a inundar toda a região nordestina, através das emissoras de rádio e dos cartazes, mostrando imagens irreais, porém sedutoras, que mostravam os seringais de cultivo da Malásia, onde os trabalhadores apareciam fazendo a sangria nas árvores de seringueiras, heveas brasilienses e depois passavam em um jeep recolhendo o látex e conduzindo até um local de processamento, e pra completar a fantasia, a propaganda garantia também que essa atividade seria uma das mais rentáveis da época e que o cidadão que se dispusesse a trabalhar na Amazônia, apenas em um ano, no máximo dois, estaria de volta para sua terra com dinheiro suficiente para melhorar sua vida e de seus familiares. A notícia e as propagandas iludiram à todos e em 1942, surgiu os primeiros emissários do governo para recrutar (alistar), somente homens solteiros de 18 a 20 anos. A meta era arrebanhar 55 mil homens, acontece que, devido o regime patriarcal da sociedade nordestina manter um comando e controle muito rígido nas famílias, a quantidade de rapazes que se apresentaram foi muito abaixo da quantidade esperada. Assim sendo, no final do ano seguinte, foi realizado um novo alistamento de “soldados da borracha” para as famílias que se dispusessem a melhorar de vida e enfrentar a aventura. Nessa segunda leva, em 1944, nossa família, os Ferreiras de Mossoró foram recrutados e rumaram para aos seringais nativos da Amazônia. Na contracapa do livro Arigó, de Raimundo F. Souza, existe uma nota que descreve a euforia dos imigrantes, nos seguintes termos. “… os fatos e episódios sobre as famílias que migraram para o Amazonas, apresentam a empolgação, as esperanças, as ansiedades, os sonhos e expectativas dos nordestinos que, animados igual a um bando de aves-de-arribação, rumaram para o vale amazônico, acreditando que iriam encontrar o paraíso verde, onde se juntava dinheiro com o cambito”.