CULTURA & ENTRETENIMENTO
Em Mâncio Lima, festival Atsa Puyanawa exalta cultura, espiritualidade e resistência indígena
Buscando celebrar culturalmente a resistência, fortalecimento da identidade e transmissão dos saberes ancestrais, o povo indígena Puyanawa realiza, entre os dias 18 e 23 de julho, a sétima edição do Festival Atsa Puyanawa. Presente no calendário oficial do estado, a abertura da festividade indígena, foi realizada na sexta-feira, 18, nas aldeias Barão e Ipiranga em Mâncio Lima, município localizado aos pés do Parque Nacional da Serra do Divisor, ponto mais ocidental do Brasil, no Acre.
O evento conta com danças, músicas, culinária típica, reunindo visitantes do Brasil e do exterior. A programação destaca a mandioca (atsa), alimento sagrado e símbolo da autonomia econômica do povo, e reforça o fortalecimento da identidade indígena na região.
“A experiência de vivenciar o festival durante estes dias, aqui na nossa terra indígena, é única. Estamos aqui com o coração aberto para receber a todos, oferecendo a nossa essência. O povo Puyanawa é humilde, acolhedor e trabalhador, e busca transmitir a sensibilidade da humildade em nossos corações a todos que assistem e participam conosco“, disse o cacique Joel Puyanawa, guardião das memórias e dos costumes do povo.
O evento foi prestigiado pelo presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Acre (Aleac), deputado estadual Nicolau Júnior, prefeito de Mâncio Lima, Zé Luiz, secretários, deputados, parceiros que atuaram na organização do festival, empresários e lideranças locais. O deputado Nicolau Júnior destacou o apoio às pautas dos povos indígenas, ressaltando o compromisso do Estado juntamente com parcerias como a Prefeitura de Mâncio Lima.
“A presença do Estado neste festival é essencial e reflete nosso compromisso com os povos indígenas. Parabenizo o povo Puyanawa por este evento que valoriza a cultura e movimenta a economia local. A parceria entre governo, prefeitura e comunidade deve servir de modelo para outras terras indígenas, pois fortalecemos também a a agricultura, a subsistência exige alternativas sustentáveis.”, frisou Nicolau.
Ao lado do chefe do Poder Legislativo estadual, o prefeito Zé Luiz ressaltou a relevância da festividade, uma vez que impulsiona a cultura, a agricultura e a economia local.
”O evento conta com apoio da prefeitura, governo estadual e Assembleia Legislativa, por meio de convênios e emendas parlamentares. R$ 100 mil foram destinados ao festival e mais de R$ 250 mil ao sistema de abastecimento de água na comunidade. A comercialização exclusiva para indígenas fortalece a economia local e valoriza os produtores. A parceria entre poder público e o povo Puyanawa é essencial para o desenvolvimento da região”, afirmou.
Durante seis dias, visitantes do Brasil e de diversos países participam do festival.
A estoniana Tuuli Roosma, vinda do Norte da Europa, participou pela primeira vez do Festival Atsa Puyanawa e se disse profundamente tocada pela conexão do povo com a natureza. Para ela, a experiência foi transformadora e revelou uma dimensão da Amazônia pouco conhecida fora do Brasil.
“Me sinto muito feliz em estar aqui neste festival indígena. Eu, meu esposo e meus filhos viemos em busca de explorar a cultura indígena brasileira, a tradição deste povo. Chegamos a aldeia e fomos recebidos com cortesia. Foi esse contato inicial, fora do Brasil, que possibilitou o encontro e a imersão na cultura indígena”, disse.
Realizado anualmente, o evento, também conhecido como Festival da Macaxeira, exalta o produto como símbolo de fartura, trabalho coletivo e independência econômica. Mais que uma festa, o Atsa é um momento de afirmação identitária, conexão com a terra e transmissão de valores entre gerações.
A origem do Povo do Sapo, segundo os próprios puyanawas
Segundo os próprios Puyanawas, a origem do “Povo do Sapo” está ligada a um mito ancestral que faz parte da cosmologia e da tradição oral transmitida pelos mais velhos. Conforme contam os anciãos, os Puyanawa são descendentes de um povo que surgiu da transformação de sapos em humanos, após um pedido feito ao criador espiritual. Esse sapo, símbolo de resistência e transformação, representa a ligação profunda do povo com a natureza e a floresta.
O nome “Puyanawa” vem do tronco linguístico pano e pode ser traduzido como “povo do sapo” ou “gente do sapo”, sendo “puya” relacionado a sapo e “nawa” a gente, povo. Essa origem mítica não é apenas uma história: ela é um pilar identitário, que reforça a relação espiritual com os seres da floresta e reafirma a sabedoria ancestral guardada por gerações.
Os puyanawas se consideram originários de três personagens do mundo ancestral. Eles são Irica, Puyawakêvu e Dukawa. Num dado momento do tempo, Irica explodiu e, do seu corpo, surgiram todos os seres da floresta chamados por eles de Dimãnã, termo que também serve para “floresta”.
De acordo com a cosmologia Puyanawa, a origem do povo está ligada à natureza e ao tempo. Antes de se tornarem humanos, seus ancestrais eram pequenos sapos surgidos da decomposição da folha da capemba, uma folha espessa que se desprende do mangará de palmeiras amazônicas e se decompõe no solo úmido. Esses sapinhos, chamados puyadawa, foram gradualmente tomando forma humana e encontrando na floresta os elementos para a sobrevivência.
As Terras Indígenas Puyanawa correspondem a uma área de 24 mil hectares, onde residem 750 indivíduos.