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GERAL

Apaixonado pelo Acre, ex-ministro Juarez Quadros escreve no Acrenews uma breve história das Comunicações do Brasil

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Leilões móveis: aplausos, reflexões e impasses para resolver

Por Juarez Quadros do Nascimento

O que deu certo nos leilões das diversas gerações de tecnologias móveis no Brasil merece aplausos. Sobre o que não deu certo, cabem reflexões sobre as motivações, consequências e aprendizagens auferidas nos processos de 1G, 2G, 3G, 4G, 5G e preparar-se para o 6G. Segundo o psicólogo americano Edward L. Thorndike (1874-1949), o aprendizado é um processo gradual no qual são feitas tentativas de aprender, no qual, à medida que as tentativas aumentam, os erros diminuem.

Sem medo de errar, pessoas que participam, ou participaram, do Ministério das Comunicações (MCom) e da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), mesmo que em algumas tentativas não tenham alcançado o resultado esperado, têm conseguido proveniente aprendizagem com acertos a permitir o cumprimento das obrigações funcionais que os cargos lhes impõem.

A chegada da telefonia celular no Brasil com 1G em 1990

A geração tecnológica 1G, com o sistema analógico Advanced Mobile Phone System (AMPS), possibilitou a comunicação móvel pessoal para a interação com a voz. Teve início nos EUA nos anos 1980 e dez anos depois, em 1990, chegou no Brasil. Teve início com as estatais, no Rio de Janeiro e Brasília, com a Telerj e Telebrasília. Em 1991, havia 13.500 celulares, sendo 11 mil no Rio e 2.500 em Brasília. A Telesp em São Paulo, em 1993, após demorada contenda entre fabricantes, expandiu o serviço para 250 mil celulares no País. Nos dois anos seguintes as demais empresas do Sistema Telebrás (STB) e as quatro empresas independentes levaram o serviço pelo Brasil. Boa Vista/Roraima, via Telaima, foi a última capital a dispor da Banda A. Infelizmente, as amarraras estatais obstruíam o atendimento da demanda dos serviço de telecomunicações.

O leilão da Banda B do Serviço Móvel Celular com 2G em 1997

Nos anos 1990, a geração 2G, com os sistemas digitais Global System for Mobile Communications (GSM) e Code Division Multiple Access (CDMA), além da voz, viabilizou as mensagens alfanuméricas curtas (Short Message Service – SMS). No Brasil o processo teve início seis anos depois, em 1996. Com a Lei Mínima (Lei 9.295/1996), o MCom promoveu a competição na telefonia celular. Foi regulamentada a faixa de frequências – chamada Banda B – a ser ocupada pelas empresas privadas que competiriam com as empresas estatais da Banda A em 10 áreas de serviço. Com a Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/1997), as empresas do STB de telefonia celular foram privatizadas em 1998, juntamente com as de telefonia fixa.

O edital de licitação para a Banda B foi lançado em janeiro/1997. Em abril/1997, a Comissão de Licitação do MCom recepcionou as propostas de 15 consórcios interessados nas diversas áreas. O primeiro contrato da Banda B foi assinado em junho/1997, para a Área 7 (MT, MS, GO, RO, AC, TO e DF). O segundo contrato foi assinado em julho/1997, para a Área 1 (Região Metropolitana da Grande São Paulo), com o vencedor pagando o maior valor do leilão, R$ 2,646 bilhões, com um ágio de 341%. O edital previa arrecadar o valor mínimo de R$ 3,7 bilhões no leilão. O resultado foi de R$ 8,3 bilhões, cerca de US$ 8 bilhões à época, com um ágio médio de 123%.

Ao longo de 1998, já com a participação da Anatel, as demais áreas foram atendidas com os serviços de telefonia celular da Banda B. Mas em uma das dez áreas não houve interessados, justamente na Área 8 (AM, AP, PA, MA e RR), área de importância político-social situada na Amazônia. A decisão foi repetir a licitação, mas, novamente não se apresentaram proponentes e outra vez a licitação foi considerada vazia. Em novo processo, mediante chamamento público, a Área 8 foi liberada à iniciativa privada pelo valor econômico de R$ 60 milhões.

Importa destacar que atrair investidores em certas regiões brasileiras não é tarefa fácil. Tanto que no leilão de desestatização das empresas do STB em junho/1998; quando foram alienadas ações ordinárias representativas de 51,79% do capital votante de cada uma das empresas; o Governo Federal vendeu o controle das empresas (quatro de telefonia fixa e oito de telefonia celular) pelo valor de R$ 22,1 bilhões, ou US$ 19 bilhões à época, mediante um ágio de 63,7%. Mas, na Tele Norte Leste Participações, abrangendo telefonia fixa em 16 estados, sendo três na região Leste, nove no Nordeste e quatro no Norte (RJ, ES, MG, BA, SE, AL, PE, PB, RN, CE, PI, MA, PA, AP, AM e RR), o preço pago pelo único proponente foi R$ 3,43 bilhões, com o ágio de 1%.

O leilão 3G em 2007

Nos anos 2000, a tecnologia 3G, com o sistema High Speed Packet Access (HSPA) e os smartphones, acrescentou o acesso móvel à internet. Mas o 3G no Brasil só iniciou operação sete anos depois, em 2007. Uma pretenciosa rede dita 3G foi instalada em 2004, baseada na tecnologia CDMA 1xEV-DO (Evolution-Data Optimized), que depois foi preterida pela operadora em favor do padrão GSM. Essa rede cobria as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba.

Em novembro/2007, duas outras operadoras requisitaram à Anatel registro de suas estações rádio base de 3G na frequência de 850 MHz, na qual atuavam. Uma dessas operadoras instalou sua rede na Grande Belo Horizonte, no padrão HSPA. A outra operadora implantou redes nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Fortaleza e Porto Alegre, também no padrão HSPA. Mas, o leilão de frequências para o 3G só ocorreu em dezembro/2007, quando arrecadou à União R$ 5,3 bilhões. Com isso, as três principais operadoras deram abrangência nacional para suas redes 3G.

O leilão de 4G em 2014

Nos anos 2010, a tecnologia 4G, com o sistema Long Term Evolution (LTE), adicionou maiores velocidades no acesso à internet banda larga móvel, o que facilitou as comunicações de voz, dados e vídeo, que foram introduzidas no Brasil com o leilão da faixa de 2,6 GHz realizado em 2012, focado principalmente nas sedes da Copa do Mundo de Futebol de 2014.

O leilão relativo à faixa de 700 MHz realizado em setembro/2014 visou a adoção da TV digital no País, pois a faixa de 700 MHz era então ocupada pela TV analógica. Quatro das cinco maiores empresas de telefonia celular venceram o leilão. A faixa que poderia ser utilizada pela quinta operadora foi declarada deserta na licitação.

A massificação do 4G só ocorreu a partir do leilão realizado em 2014 para a faixa de 700 MHz, onde se permitiu assumir os compromissos de abrangência previstos no leilão da faixa de 2,6 GHz, realizado em 2012. Assim, o edital de 4G com 700 MHz dispôs precificação para as empresas que utilizassem a faixa, ou qualquer outra, a fim de cumprir as metas assumidas em 2012 em 2,6 GHz, visando compensar possíveis vantagens competitivas.

A licitação da faixa de 700 MHz recolheu à União R$ 5,4 bilhões pagos pelas quatro operadoras. O edital dispôs que as vencedoras do leilão constituiriam uma entidade sem fins lucrativos para operacionalizar a liberação da faixa, sendo responsável, entre outras obrigações, pelo custeio do remanejamento dos canais, distribuição de receptores de sinal digital às famílias inscritas em programas sociais do governo federal e pela mitigação de eventuais interferências nos serviços. Para isso, foi determinado pela Anatel que as operadoras aportassem R$ 3,6 bilhões adicionais à entidade administradora da digitalização.

Com a participação dos setores de radiodifusão e telecomunicações ficou claro ser possível implantar políticas públicas colaborativas com resultados efetivos na sua execução. Paralelamente, tornou-se possível transferir recurso público para uma entidade privada, com o objetivo de operacionalizar o processo. Essa inovação regulatória foi replicada no leilão de 5G.

O leilão de 5G em 2021

A geração tecnológica de 5G surgiu em 2020. Um ano depois, em 2021, a Anatel fez o leilão e as empresas vencedoras iniciaram operação em julho/2022. Apreciando o tempo futuro, realizou-se o maior leilão de frequências da história das Comunicações no País, com a alocação total de 3.710 MHz, nas faixas de 700 MHz; 2,3 GHz; 3,5 GHz e 26 GHz. O leilão no valor econômico de R$ 47,2 bilhões dispôs obrigações de investimentos sociais de R$ 42,2 bilhões e arrecadou ao Tesouro R$ 4,8 bilhões. Exigiu redes 5G na versão avançada StandAlone (SA) que não aproveita o core de redes 3G, 4G, ou compartilhamento dinâmico de espectro (DSS) e colocou o Brasil entre os países líderes com a tecnologia 5G SA.

Os compromissos socioeconômicos do leilão de 5G obrigam cobertura 4G, ou superior, em áreas não atendidas, fibra óptica em cidades que ainda não a têm etc. Adicionalmente, na área da Educação; com o aporte de R$ 3,1 bilhões; obriga conectar 138 mil escolas públicas de educação básica, com o aporte de R$ 3,1 bilhões. Limpar a faixa de 3,5 GHz, incluindo a migração da TV aberta e gratuita com antenas parabólicas na banda C satelital para a banda Ku, com o aporte de R$ 3,96 bilhões. Implantar o Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS), com o aporte de R$ 1,34 bilhão e o Projeto Rede Privativa de Comunicação da Administração Pública Federal, com o aporte de R$ 1,0 bilhão. Para operacionalizar os R$ 6,3 bilhões aportados foram criadas duas entidades administradoras. A primeira, para o programa na área da Educação, requer atenção. A segunda, para os demais programas, progride aceleradamente.

O Programa PAIS, voltado para a Amazônia, trata da instalação de mais de 12 mil Km de cabos com fibras óticas pelos rios nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima, a permitir conectar 59 municípios com vários anéis de cabos ópticos, em estratégicas redundâncias para a conectividade da Região Amazônica. Em dezembro/2023, a Anatel fez a inclusão de cinco novas infovias, com o objetivo de conectar mais 19 localidades e construir mais mil quilômetros de cabos ópticos nos rios Tocantins, Xingu e Tapajós; que somados com os 12 mil km de cabos nos rios Amazonas/Solimões, Madeira, Acre/Purus, Juruá e Negro/Rio Branco; permitirá uma Amazônia mais conectada.

Mas, um fato merece atenção. No leilão de 5G, foi licitada a faixa de 700 MHz que sobrou no leilão de 4G. Esse lote foi idealizado para ser operado a partir de uma matriz de rede neutra. Dentre os compromissos assumidos pela adjudicatária, constava a obrigação de ofertar rede no atacado para terceiros provedores. Também deveria levar conectividade a rodovias federais e localidades sem 4G a partir do final de 2023. A superar duas propostas concorrentes, a vencedora comprou a faixa licitada com o lance de R$ 1,42 bilhão, ágio de 850%, ante o valor mínimo de R$ 157,6 milhões. Entretanto, ao final de 2023, a empresa renunciou ao uso da faixa adquirida.

A renúncia deixa sem cobertura de serviço celular 31 mil km de rodovias federais e 625 localidades remotas, assim como, o compartilhamento de infraestrutura para atender operadoras regionais entrantes. Agora, cabe à Anatel solucionar o impasse. Poderá fazer novo leilão, ou convocar os segundos colocados, ou distribuir a faixa de frequência para os entrantes regionais mediante chamamento público, ou adotar alternativa regulatória inovadora.

Considerações finais

Por fim, cabe-nos refletir sobre como suprir infraestruturas no Brasil, com ênfase no Norte e Nordeste. Essas regiões, com imensas áreas geográficas, baixo poder aquisitivo, baixa densidade populacional, serviços altamente dispendiosos, precisam atrair os investimentos nos diversos setores, entre eles, escolas, hospitais, portos, aeroportos, rodovias, energia, transporte e comunicações. Ainda mais na Amazônia, a marca mais conhecida do planeta. Na geografia dessa região, as certezas se desfazem. Atuar na Amazônia, permite-nos entender a força da sua natureza. Lá tudo é extremamente diverso e descrever os seus excessos é pouco. Navegar pelos seus rios, penetrar nas suas florestas, trafegar por estradas carroçáveis, voar nos seus céus, instalar infraestruturas etc., é um misto de tarefas deslumbrantes, desafiadoras e gratificantes.

(*) O autor é Engenheiro Eletricista. Foi ministro de Estado das Comunicações e presidente da Anatel.

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