ARTIGO
Artigo: Especialista em economia contemporânea escreve sobre o “Mercado Verde”
MERCADO VERDE: RESSIGNIFICADO DA ECONÔMICA
A história revela que a construção da sociedade se estabeleceu, por meio da troca da mercadoria, envolta em um certo grau ético. Inicialmente a troca se dava por itens essenciais à vida e, pouco a pouco, foram se criando instrumentos ágeis até a evolução de mercado alcançada para atingir uma necessidade primária: satisfazer nosso bem-estar e necessidades.
Em pleno século XXI, essa dinâmica de mercado segue em plena evolução. Mas antes de irmos ao próximo ponto, vamos definir a palavra mercado, que deriva do latim, ambiente onde ocorrem a interação humana entre compradores e vendedores, os quais também podemos chamar de “agentes econômicos”, quer seja para troca voluntária, segura e transparente de bens e serviços voltados para produção ou consumo, cujo processo inicialmente, impulsionado pela permuta, aprimorou-se pela unidade monetária, conhecida hoje por dinheiro e/ou metal precioso.
Partindo desse contexto clássico mercadológico, o mercado verde advém de conjunturas econômicas, políticas, sociais e evolutivas da tecnologia e inovação contemporâneas. Já na metade de século XX, encontros do Clube de Roma (1950), a Conferência de Estocolmo (1972) e a Eco-92 trouxeram como pano de fundo uma “mudança de mercado”, em que os riscos ambientais e as mudanças climáticas passam a ser a grande preocupação para manutenção da vida e do planeta. Em 1992, foi adotada a concepção de desenvolvimento sustentável e da necessidade geopolítica global de adaptação dos mercados a um modelo mais eficiente do ponto de vista produtivo e conservador das riquezas naturais. Tudo isso alinhado à emergente necessidade de se firmar um compromisso entre a sociedade do presente com a do futuro.
Os pilares desse mercado, ainda em construção, se encontram nos instrumentos de atuação estabelecidos no Protocolo de Kyoto, cuja vigência se deu em 2007 e, se aprimora, a partir do Acordo de Paris (2015) com definição de compromissos ambiciosos de redução da emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) – que agravam o aquecimento global – pondo em risco o modo de vida e a sustentabilidade do planeta.
Dentro desse contexto temos o que conhecemos atualmente como mercado verde: uma composição qualificada do modelo de mercado capitalista já conhecido. Essa qualificação decorre da mudança de perspectiva quanto à oferta de novos produtos e serviços advindos da natureza: serviços ecossistêmicos e serviços ambientais, sua forma de valoração e remuneração, que se dá por meio da agregação de valor e Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), os quais estão associados aquilo que a natureza oferece para sustentar a vida na terra.
Serviços ecossistêmicos são os que a própria natureza conservada propicia ao ser humano: a qualidade agradável do clima, a abundância das águas, a extração de alimentos e outros. Os serviços ambientais são os que o homem presta à natureza, por meio de atitudes mais conservadoras e que, ao mesmo tempo, atende uma necessidade humana: alimento, remédio, vestuário, entre outros, e igualmente mais resiliente aos recursos naturais, a exemplo temos a exploração racional das águas e produção sem uso de agrotóxicos. Por sua vez, os ativos ambientais são o fruto (custo de oportunidade) da adaptação produtiva em que o homem atende uma necessidade ao mesmo tempo em que agrega valor ao bem ou serviço produzido em mercado, por exemplo: a carne bovina (ou boi verde) proveniente de área de conservação ambiental (sem desmatamento) e sem uso de anabolizantes tem maior valor agregado que a carne bovina sem essa responsabilidade socioambiental.
Toda essa engrenagem chamada ecossistema permite a geração de produtos como a madeira, fibra, peixes, remédios, sementes, combustíveis naturais, conservação do solo e água, entre outros, essenciais para a sobrevivência humana na terra. Essa geração de ativos ambientais passa a agregar valor ao bem ou serviço, decorrente de esforços socioambientais, sendo definido, de acordo com padrões metodológicos rígidos e de alta integridade estabelecidos, em documentos internacionais devidamente internalizados no sistema normativo de cada país interessado.
Então podemos, sob ótica mercadológica, afirmar que tais são essenciais para o consumidor, quer seja indivíduos e/ou países. Esses mecanismos financeiros se dão, por meio de metodologias específicas de mensuração dos valores a serem agregados com o surgimento de novas formas monetárias, a exemplo, de cripto ativos, ativos ambientais e outros ativos, convergindo a atuação de mercado à finalidade ética de atingir maior inclusão social e proteção do meio ambiente associado a estratégias e metas para redução do aquecimento global.
Assim, o mercado verde ressignifica o velho capitalismo de mercado clássico, dando lugar a um capitalismo que se regenera e cuja interação entre os atores econômicos (indivíduos, empresas, países) se torna mais integrativa e socioambientalmente responsável, que tem como principais vetores a geração de conhecimento para eficiência produtiva e motivado não apenas pelo lucro e eficiência econômico-financeira, mas, também, por valores de justiça e bem-estar de todos e do planeta.
José Luiz Gondim dos Santos
Advogado, Gestor de Políticas Públicas, Mestre em Ciências e Especialista em Economia Contemporânea,
com experiência em projetos de políticas públicas e programas de integridade e Environmental,
Social and Governance (ESG).