PITTER LUCENA
Pitter Lucena relembra Bimbão e seu eterno Mundo Cão, programa mais ouvido da história do rádio no Acre
Naquelas manhãs de café acolhedor, um som reverberava pelos lares acreanos, atravessando os rios e adentrando as matas densas, como uma voz das próprias selvas. Era o rugido do rádio, e o responsável por essa sinfonia radiofônica era um homem grande, de voz trovejante e coração audaz: Estevão Bimbi, o Bimbão.
Pelas ondas da Rádio Difusora Acreana, a voz das selvas, ecoava “O Mundo Cão”, o programa policial de maior audiência de todos os tempos. Bimbão cativou o público com sua presença marcante, e seu programa tornou-se uma parada obrigatória para todos que desejavam desbravar os recantos mais obscuros da sociedade acreana. “Começa agora o Mundo Cão. Você que tem nervos fracos desligue o seu rádio”, anunciava ele, fazendo com que todos se sentissem parte de uma aventura emocionante e, ao mesmo tempo, assustadora.
Conheci Bimbão na década de 80 e logo nos tornamos amigos. Sua personalidade era tão imponente quanto sua voz, mas por trás da aparência robusta, havia um coração generoso e caloroso. Ele estimava a amizade, a família e o trabalho como radialista, e a busca incessante pela verdade dos fatos o tornou um jornalista respeitado.
Bimbão tinha o dom de contar histórias com maestria. Quando nos reuníamos, suas narrativas eram sempre carregadas de suspense e mistério, mantendo-nos atentos a cada palavra. Ele sabia como cativar sua plateia e transportá-la para um universo de emoções intensas.
Enquanto o Mundo Cão se estabelecia como um fenômeno radiofônico, o respeito conquistado por Bimbão ia além das ondas do rádio. Ele era admirado no mundo político por sua integridade e ética jornalística, e, curiosamente, até mesmo no meio da bandidagem, onde sua figura impunha respeito e temor.
Em meio às várias seções intrigantes do programa, um quadro se destacava, chamado “As Profecias do Frei Damião”. Era de arrepiar. Com um tom profético, Bimbão discorria sobre o fim do mundo, especificamente na virada do ano 2000. Suas palavras reverberavam na mente dos ouvintes, gerando apreensão e ansiedade.
Muitos anos se passaram, e a vida nos levou por caminhos distintos. Mas nunca esqueci da figura carismática de Bimbão. Em uma tarde ensolarada, visitei-o em sua casa, enquanto se recuperava de uma cirurgia. Ali, pude sentir a força de sua essência, um homem que enfrentou os desafios com a mesma bravura que inspirava em seu público.
O Mundo Cão do Bimbão foi uma audiência absoluta por quase duas décadas, e sua presença deixou marcas profundas na memória de todos que tiveram o privilégio de ouvi-lo. Seu legado continua a reverberar no coração dos acreanos, e sua voz poderosa jamais se calará completamente.
Estevão Bimbi, o Bimbão, o trovão das selvas, provou que o rádio não é apenas um meio de comunicação, mas uma conexão entre as pessoas, capaz de marcar vidas e histórias. E assim, ele permanecerá eternamente, como uma lenda no universo radiofônico acreano.
Pitter Lucena – Jornalista e escritor