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PITTER LUCENA

Pitter Lucena lembra as catraias sobre o rio Acre em seu artigo deste 15 de novembro

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CATRAIAS DO TEMPO

Numa época, que não faz muito tempo, em que o rio Acre desenhava histórias de um povo simples e corajoso que dependia das águas para tecer seu cotidiano. O sol, como sempre, nascia timidamente, pintando o céu com tons alaranjados, enquanto as águas do rio, refletindo o espetáculo celeste, anunciavam mais um dia de desafios para os catraieiros e suas intrépidas catraias.
A catraia, barco de madeira robusta, era a fiel companheira dos catraieiros, homens destemidos que enfrentavam as intempéries do tempo e as correntezas do rio. A relação entre o homem e sua embarcação era mais que profissional; era uma simbiose, uma aliança de sobrevivência. O catraieiro com mãos habilidosas e olhar atento, conduzia sua catraia pelos meandros do rio Acre, conhecia cada curva, cada pedra submersa ou banco de areia, como se fossem extensões de seu próprio corpo.
Com músculos vigorosos, trabalhados não pela vaidade, mas pela necessidade, o catraieiro era um arauto da resistência. Seu rosto anônimo e sua história silenciosa ecoavam nos múrmuros das águas. Calejadas pelo remo, suas mãos contavam as histórias do rio, rugas profundas marcadas não apenas pelo passar dos anos, mas pela carga de sofrimento que carregava.
O amanhecer no banco dianteiro da catraia era um ritual diário, uma dança sincronizada com o sol nascente. O remo, prolongamento das mãos calejadas, cortava as águas como uma extensão do próprio destino. Homem e barco, numa dança ancestral, navegavam pelos tempos difíceis, enfrentando chuvas torrenciais e sol escaldante, sem descanso, sem hora marcada para saídas ou chegadas.
A chuva, muitas vezes, era uma companheira indesejada, testando a resistência do catraieiro e sua catraia. As águas barrentas inquietas, o céu chorando incessantemente, mas o barco seguia, enfrentando as adversidades com a coragem que só quem depende do rio para viver conhece.
Era uma vida marcada pelo trabalho árduo, pelo suor que se misturava às águas do rio. As rugas no rosto do catraieiro eram mapas da experiência, cicatrizes de batalhas travadas contra a natureza. Mas não havia lamento, apenas a resignação silenciosa de quem aceitava o destino entrelaçado com as correntezas do rio Acre.
As catraias, pequenas e valentes, eram o elo entre as margens do rio e os corações daqueles que dependiam daquele meio de transporte. Testemunhas silenciosas de histórias vividas a bordo, carregavam consigo as memórias de um tempo que se desenhava nas correntezas rumo ao mar.
Os catraieiros, apesar de anônimos na grande narrativa da história, eram os heróis cotidianos, os navegadores destemidos que moldaram as margens do rio com suas mãos fortes e determinação inabalável. Jamais tiveram seus rostos eternizados em monumentos, mas suas histórias ecoam nas lembranças daqueles que, um dia, foram conduzidos pelas águas serenas e turbulentas do rio Acre.
Nesse mundo que chamamos de moderno, as catraias ainda resistem em alguns pontos da cidade de Rio Branco. Outras foram substituídas por sinuosas pontes de aço ou concreto, mas a nostalgia flutua como uma brisa suave, relembrando-nos da era em que homens e barcos eram uno, enfrentando juntos as águas do tempo.
As memórias dos catraieiros e de suas catraias jamais serão esquecidas. Eles eram os artífices do transporte, os navegadores destemidos que moldaram a história da região. O rio Acre, testemunha silenciosa, guardaria para sempre as marcas deixadas por esses bravos homens e suas embarcações, que, mesmo na simplicidade de suas existências, deixaram um legado imortal nas águas que um dia navegaram.

Pitter Lucena é jornalista e escritor

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